CapÃtulo I - Parte I
XV
TATYANA BORISSOVNA E SEU SOBRINHO
Dê-me a mão, gentil leitor, e venha comigo. O tempo está glorioso; um azul terno tinge o céu de maio; as folhas jovens e lisas dos salgueiros brilham como se tivessem sido polidas; a estrada larga e plana está toda coberta por aquela grama delicada de caule avermelhado que as ovelhas tanto gostam de mordiscar; à direita e à esquerda, sobre as longas encostas inclinadas, o centeio verde ondula suavemente; as sombras de pequenas nuvens deslizam em finas e longas faixas sobre ele. Ao longe, a massa escura das florestas, o brilho dos açudes e as manchas amarelas da aldeia; cotovias às centenas pairam, cantam, mergulham de cabeça com o pescoço estendido, saltitando pelos torrões; os corvos na estrada param, olham para você, bicam a terra, deixam você se aproximar, e com dois pulos se afastam preguiçosamente. Numa colina, além de um barranco, um camponês ara; um potro malhado, com a cauda tosada e a crina despenteada, corre em pernas bambas atrás de sua mãe; seu relincho estridente nos alcança. Seguimos para o bosque de bétulas e inalamos a fragrância forte, doce e fresca. Aqui estamos nos limites da propriedade. O cocheiro desce, os cavalos bufam; os cavalos de tiro olham ao redor; o cavalo central nos varais abana a cauda e vira a cabeça para o jugo de madeira acima dele... o grande portão se abre rangendo; o cocheiro senta-se. Avante! A aldeia está à nossa frente. Passando por cinco propriedades e virando à direita, descemos por uma depressão e seguimos por um dique, do outro lado de um pequeno açude; atrás das copas arredondadas dos lilases e macieiras, um telhado de madeira, outrora vermelho, com duas chaminés, aparece; o cocheiro segue pela sebe à esquerda e, ao latido espasmódico e sonolento de três cães da raça pug, passa pelos portões amplamente abertos, gira agilmente pelo pátio largo, passando pelo estábulo e pelo celeiro, saúda galantemente a velha governanta, que passa de lado sobre a alta ombreira da porta aberta da despensa, e finalmente para diante dos degraus de uma casa escura com janelas claras...
Estamos na casa de Tatyana Borissovna. E aqui está ela mesma abrindo a janela e acenando para nós...
— Bom dia, senhora!
Tatyana Borissovna é uma mulher de cinquenta anos, com olhos cinzentos grandes e proeminentes, um nariz bastante largo, bochechas rosadas e um queixo duplo. Seu rosto transborda simpatia e bondade. Ela foi casada uma vez, mas logo ficou viúva. Tatyana Borissovna é uma mulher muito notável. Ela vive em sua pequena propriedade, nunca saindo dela, convive muito pouco com os vizinhos, vê e gosta apenas de jovens. Ela era filha de pequenos proprietários rurais muito pobres e não recebeu educação; ou seja, não sabe francês; nunca esteve em Moscou — e, apesar de todos esses defeitos, é tão boa e simples em seus modos, tão ampla em suas simpatias e ideias, tão pouco infectada pelos preconceitos comuns das damas rurais de poucos recursos, que não se pode deixar de maravilhar-se com ela... De fato, uma mulher que vive o ano todo no campo e não fala mal dos outros, nem se queixa, nem faz reverências, nunca se aflige, nem se deprime, nem se agita de curiosidade, é uma verdadeira maravilha! Ela geralmente usa um vestido de tafetá cinza e uma touca branca com laços lilases; ela gosta de boa comida, mas não em excesso; todo o trabalho de conservas, picles e salga ela deixa para sua governanta.
— O que ela faz o dia todo? — você perguntará.
— Ela lê? — Não, ela não lê e, para dizer a verdade, os livros não são escritos para ela...
Se não há visitas com ela, Tatyana Borissovna senta-se sozinha à janela, tricotando uma meia no inverno; no verão, ela está no jardim, plantando e regando suas flores, brincando por horas com seus gatos ou alimentando seus pombos... Ela não participa muito da administração de sua propriedade. Mas se uma visita a procura — algum jovem vizinho de quem ela gosta — Tatyana Borissovna se enche de vida logo; ela o faz sentar, serve-lhe chá, ouve sua conversa, ri, à s vezes acaricia sua bochecha, mas fala pouco; em momentos de dificuldade ou tristeza, ela conforta e dá bons conselhos. Quantas pessoas lhe confiaram segredos de famÃlia e as mágoas de seus corações, e choraram em suas mãos! Às vezes ela senta em frente ao visitante, apoiando-se levemente no cotovelo, e olha com tanta simpatia para o rosto dele, sorri tão afetuosamente, que ele não pode deixar de sentir:
— Que mulher querida e boa você é, Tatyana Borissovna! Deixe-me dizer o que está em meu coração.
Sente-se feliz e aquecido em seus pequenos e aconchegantes quartos; em sua casa é sempre, por assim dizer, bom tempo. Tatyana Borissovna é uma mulher maravilhosa, mas ninguém se maravilha com ela; seu bom senso, sua amplitude e firmeza, sua calorosa simpatia pelas alegrias e tristezas dos outros — em uma palavra, todas as suas qualidades são tão inatas nela; elas não lhe dão trabalho, nem esforço... Não se pode imaginá-la de outra forma, e por isso não se sente necessidade de agradecê-la. Ela gosta particularmente de observar as travessuras e loucuras dos jovens; cruza as mãos sobre o peito, joga a cabeça para trás, semicerra os olhos e senta-se sorrindo para eles, então de repente solta um suspiro e diz:
— Ah, meus filhos, meus filhos!
Às vezes dá vontade de se aproximar dela, pegar suas mãos e dizer:
— Deixe-me dizer, Tatyana Borissovna, você não sabe o seu próprio valor; apesar de toda a sua simplicidade e falta de instrução, você é uma criatura extraordinária!
Seu próprio nome tem um toque doce e familiar; sente-se prazer ao proferi-lo; evoca um sorriso gentil de imediato. Quantas vezes, por exemplo, por acaso perguntei a um camponês:
— Diga-me, meu amigo, como faço para chegar a Grachevka? — digamos.
— Bem, senhor, primeiro você vai a Vyazovoe, e de lá para a casa de Tatyana Borissovna, e da casa de Tatyana Borissovna qualquer um lhe mostrará o caminho.
E ao nome de Tatyana Borissovna, o camponês abana a cabeça de uma maneira bem especial. Sua casa é pequena, de acordo com seus meios. A casa, a lavanderia, os armazéns e a cozinha estão a cargo da governanta, Agafya, outrora sua ama de leite, uma criatura bondosa, chorona e sem dentes; ela tem sob seu comando duas moças robustas com bochechas cor de carmesim como maçãs Antonovsky. As funções de criado, mordomo e garçom são desempenhadas por Policarp, um velho extraordinário de setenta anos, um tipo peculiar, cheio de erudição, outrora violinista e adorador de Viotti, com uma hostilidade pessoal a Napoleão, ou, como ele o chama, Bonaparty, e uma paixão por rouxinóis. Ele sempre mantém cinco ou seis destes últimos em seu quarto; no inÃcio da primavera, ele se senta por dias inteiros junto à gaiola, esperando o primeiro trinadilho, e quando o ouve, cobre o rosto com as mãos e geme:
— Oh, piedoso, piedoso! — e derrama lágrimas em torrentes.
Policarp tem, para ajudá-lo, seu neto Vasya, um menino de doze anos de cabelos encaracolados e olhos perspicazes; Policarp o adora e resmunga com ele de manhã à noite. Ele também se encarrega de sua educação.
— Vasya — ele diz —, diga que Bonaparty era um patife.
— E o que você me dará, vovô?
— O que eu vou te dar?... Não vou te dar nada... Ora, o que você é? Você não é russo?
— Sou mtchanin, vovô; nasci em Mtchensk.
— Oh, tonto! Mas onde fica Mtchensk?
— Como posso saber?
— Mtchensk fica na Rússia, tolo!
— Bem, e daÃ, se fica na Rússia?
— E daÃ? Ora, Sua Alteza, o falecido PrÃncipe Mihalo Ilarionovitch Golenishtchev-Kutuzov-Smolensky, com a ajuda de Deus, gentilmente expulsou Bonaparty dos territórios russos. É sobre esse evento que a canção foi composta: "Bonaparty não está com vontade de dançar, Ele perdeu as ligas que trouxe da França."... Você entende? Ele libertou sua pátria.
— E o que isso tem a ver comigo?
— Ah! Seu menino tolo! Ora, se Sua Alteza o PrÃncipe Mihalo Ilarionovitch não tivesse expulsado Bonaparty, algum monsenhor estaria batendo em sua cabeça com um bastão neste minuto. Ele viria até você assim, e diria: "Koman voo porty voo?" E então, um tabefe na orelha!
— Mas eu daria um soco na barriga dele.
— Mas ele continuaria: "Bonzhur, bonzhur, veny ici", e então um tapa na cabeça.
— E eu daria um nas pernas dele, nas pernas tortas.
— Você está certo, as pernas deles são tortas... Bem, mas suponha que ele amarrasse suas mãos?
— Eu não deixaria; eu chamaria Mihay, o cocheiro, para me ajudar.
— Mas, Vasya, suponha que você não fosse páreo para o francês nem mesmo com Mihay?
— Não seria páreo para ele! Veja como Mihay é forte!
— Bem, e o que você faria com ele?
— Nós o deitarÃamos de costas, nós o farÃamos.
— E ele gritaria: "Pardon, pardon, seevooplay!"
— Nós dirÃamos a ele: "Nada de seus seevooplays, seu velho francês!"
— Bravo, Vasya!... Bem, agora então, grite: "Bonaparty é um patife!"
— Mas você tem que me dar um pouco de açúcar!
— Seu canalha!
Das senhoras vizinhas, Tatyana Borissovna vê muito pouco; elas não se importam em visitá-la, e ela não sabe como diverti-las; o som da tagarelice delas a faz dormir; ela se assusta, tenta manter os olhos abertos e volta a cochilar. Tatyana Borissovna geralmente não é apegada a mulheres. Uma de suas amigas, um jovem bom e inofensivo, tinha uma irmã, uma solteirona de trinta e oito anos e meio, uma criatura bondosa, mas exagerada, afetada e entusiasta. Seu irmão lhe havia falado frequentemente sobre a vizinha. Numa bela manhã, nossa solteirona sela seu cavalo e, sem dizer uma palavra a ninguém, parte para a casa de Tatyana Borissovna. Em seu longo hábito, com um chapéu na cabeça, um véu verde e cachos soltos, ela entrou no hall e, passando pelo Vasya apavorado, que a tomou por uma bruxa da floresta, correu para a sala de estar. Tatyana Borissovna, assustada, tentou levantar-se, mas suas pernas cederam.
— Tatyana Borissovna — começou a visitante com uma voz suplicante —, perdoe minha temeridade; sou irmã de seu amigo, Alexy Nikolaevitch K----, e ouvi tanto sobre você dele que resolvi fazer sua apresentação.
— Muito honrada — murmurou a senhora confusa.
A irmã jogou fora o chapéu, sacudiu os cachos, sentou-se perto de Tatyana Borissovna; pegou-a pela mão...
— Então, esta é ela — começou ela com uma voz pensativa e cheia de sentimento —: este é aquele ser doce, puro, nobre, santo! Esta é ela! Aquela mulher ao mesmo tempo tão simples e tão profunda! Como estou feliz! Como estou feliz! Como nos amaremos! Finalmente posso respirar tranquilamente... Eu sempre a imaginei assim — acrescentou ela em um sussurro, com os olhos fixos nos olhos de Tatyana Borissovna. — Você não vai ficar brava comigo, vai, minha querida e gentil amiga?
— Realmente, estou encantada!... Você não quer um chá?
A senhora sorriu condescendentemente:
— Wie wahr, wie unreflectiert — murmurou ela, como para si mesma. — Deixe-me abraçá-la, minha querida!
A velha solteirona ficou três horas na casa de Tatyana Borissovna, sem parar de falar um instante. Ela tentou explicar à sua nova conhecida toda a sua significância. Imediatamente após a partida da inesperada visitante, a pobre senhora tomou um banho, bebeu água de flor de tÃlia e foi para a cama. Mas no dia seguinte a velha solteirona voltou, ficou quatro horas e partiu, prometendo visitar Tatyana Borissovna todos os dias. Sua ideia, observe, era desenvolver, completar a educação de uma natureza tão rica, para usar sua própria expressão, e ela provavelmente a teria realmente matado, se não tivesse, em primeiro lugar, se desiludido completamente com o amigo de seu irmão em quinze dias, e em segundo lugar, se apaixonado por um jovem estudante que visitava a vizinhança, com quem ela imediatamente iniciou uma correspondência fervorosa e ativa; em suas missivas ela o consagrava, como costumam fazer tais pessoas, a uma vida nobre e santa, oferecia-se inteiramente como sacrifÃcio, pedia apenas o nome de irmã, lançava-se em descrições intermináveis da natureza, fazia alusões a Goethe, Schiller, Bettina e filosofia alemã, e levou o jovem infeliz ao mais negro dos desesperos. Mas a juventude se afirmou: numa bela manhã ele acordou com um ódio tão furioso por 'sua irmã e melhor das amigas' que quase matou seu criado em sua paixão, e ficou mal-humorado por muito tempo depois à menor alusão a paixões elevadas e desinteressadas. Mas a partir daquele momento, Tatyana Borissovna começou a evitar toda intimidade com as senhoras da vizinhança mais do que nunca.
Ai! Nada é duradouro nesta terra. Tudo o que relatei sobre o modo de vida de minha vizinha bondosa é coisa do passado; a paz que costumava reinar em sua casa foi destruÃda para sempre. Há mais de um ano, vive com ela um sobrinho, artista de Petersburgo. Foi assim que aconteceu.
Há oito anos, vivia com Tatyana Borissovna Andryusha, um menino de doze anos, órfão e filho de seu irmão. Andryusha tinha olhos grandes, claros e úmidos, uma boca minúscula, um nariz regular e uma testa fina e altiva. Ele falava em voz baixa e doce, era atencioso e persuasivo com as visitas, beijava a mão da tia com a sensibilidade de um órfão; e mal alguém chegava, ele já tinha puxado uma cadeira. Ele não tinha truques travessos; nunca fazia barulho; sentava-se sozinho num canto com um livro, e com tanta serenidade e propriedade, nunca sequer se recostava na cadeira. Quando uma visita entrava, Andryusha se levantava, com um sorriso decoroso e um rubor; quando a visita saÃa, ele se sentava novamente, tirava do bolso uma escova e um espelho, e penteava o cabelo. Desde os primeiros anos, ele havia demonstrado gosto por desenhar. Sempre que pegava um pedaço de papel, pedia imediatamente à governanta Agafya uma tesoura, cortava cuidadosamente um pedaço quadrado do papel, traçava uma borda ao redor e começava a trabalhar; desenhava um olho com uma pupila imensa, ou um nariz grego, ou uma casa com uma chaminé e fumaça em forma de saca-rolhas saindo dela, um cachorro, de frente, parecendo mais um banco, ou uma árvore com dois pombos nela, e assinava: 'Desenhado por Andrei Byelovzorov, tal dia em tal ano, na aldeia de Maliya-Briki.' Ele se esforçava com especial afinco por quinze dias antes do aniversário de Tatyana Borissovna; ele era o primeiro a apresentar suas felicitações e oferecer a ela um rolo de papel amarrado com uma fita rosa. Tatyana Borissovna beijava seu sobrinho e desfazia o nó; o rolo era desdobrado e apresentado ao olhar inquisitivo do espectador, um templo redondo, ousadamente esboçado em sépia, com colunas e um altar no centro; no altar jaziam um coração ardente e uma coroa de flores, enquanto acima, em um pergaminho enrolado, estava inscrito em caracteres legÃveis: 'À minha tia e benfeitora, Tatyana Borissovna Bogdanov, de seu sobrinho obediente e amoroso, como um sinal de seu mais profundo afeto.' Tatyana Borissovna o beijava novamente e lhe dava um rublo de prata. Ela não sentia, porém, muito afeto por ele; os modos bajuladores de Andryusha não eram muito do seu agrado. Enquanto isso, Andryusha estava crescendo; Tatyana Borissovna começou a se preocupar com o futuro dele. Um incidente inesperado resolveu a dificuldade para ela.
Um dia, oito anos atrás, ela recebeu a visita de um certo Sr. Benevolensky, Piotr Mihalitch, um conselheiro colegial com uma condecoração. O Sr. Benevolensky, em dado momento, ocupou um cargo oficial na cidade distrital mais próxima e foi assÃduo em suas visitas a Tatyana Borissovna; depois, ele se mudou para Petersburgo, entrou para o ministério e alcançou uma posição bastante importante, e em uma das inúmeras viagens que fez no desempenho de suas funções oficiais, ele se lembrou de sua velha amiga e voltou para vê-la, com a intenção de descansar por dois dias de seus trabalhos oficiais 'no seio da paz da natureza'. Tatyana Borissovna o cumprimentou com sua cordialidade habitual, e o Sr. Benevolensky... Mas antes de prosseguirmos com o restante da história, gentil leitor, vamos apresentá-lo a este novo personagem.
O Sr. Benevolensky era um homem corpulento, de estatura média e aparência gentil, com perninhas curtas e mãos gordinhas; vestia um fraque folgado e excessivamente elegante, gravata alta e larga, roupa de baixo branca como a neve, uma corrente de ouro no colete de seda, um anel com gema no dedo indicador e uma peruca branca na cabeça; falava suavemente e persuasivamente, pisava sem fazer barulho e tinha um sorriso amável, um olhar amável nos olhos e um jeito amável de ajeitar o queixo contra a gravata; era, de fato, uma pessoa amável por completo. Deus também lhe dera um coração muito suave; ele se comovia facilmente às lágrimas e a arrebatamentos; além disso, ele ardia de paixão desinteressada pela arte: desinteressada, com certeza, pois o Sr. Benevolensky, para dizer a verdade, não sabia absolutamente nada sobre arte. Indaga-se, de fato, de onde, em virtude de que forças misteriosas e incompreendidas, essa paixão o teria tomado. Ele era, aparentemente, uma pessoa prática, até prosaica... no entanto, temos muitas pessoas do mesmo tipo entre nós na Rússia.
Sua devoção à arte e aos artistas produz nessas pessoas uma melosidade indescritÃvel; é angustiante lidar com elas e conversar com elas; são verdadeiros toros lambuzados de mel. Elas nunca, por exemplo, chamam Rafael de Rafael, ou Correggio de Correggio; 'o divino Sanzio, o incomparável di Allegri', murmuram, e sempre com as vogais mais abertas. Qualquer mediocridade pretensiosa, vaidosa e caseira é saudada como um gênio: 'o céu azul da Itália', 'os limões do Sul', 'as brisas suaves das margens do Brenta', estão sempre em seus lábios.
— Ah, Vasya, Vasya — ou — Oh, Sasha, Sasha — dizem um ao outro com profunda emoção — precisamos ir para o Sul... somos gregos de alma — gregos antigos.
Pode-se observá-los em exposições diante das obras de alguns pintores russos (esses senhores, deve-se notar, são, em sua maioria, patriotas apaixonados). Primeiro, eles recuam alguns passos e jogam a cabeça para trás; depois, voltam à pintura; seus olhos ficam mareados de uma umidade oleosa...
— Lá está, meu Deus! — dizem finalmente, com vozes embargadas pela emoção — há alma, alma! Ah! Que sentimento, que sentimento! Ah, que alma ele colocou nisso! Que massa de alma!... E como ele pensou nisso! Pensou nisso como um mestre!
E, oh! Os quadros em suas próprias salas de estar! Oh, os artistas que vêm a eles à noite, tomam chá e ouvem sua conversa! E as vistas em perspectiva que eles fazem de seus próprios quartos, com uma vassoura em primeiro plano, uma pequena pilha de poeira no chão polido, um samovar amarelo em uma mesa perto da janela, e o próprio dono da casa de gorro e robe, com um brilhante raio de sol caindo em sua bochecha! Oh, os pupilos de cabelos longos da Musa, usando sorrisos espasmódicos e desdenhosos, que se aglomeram ao redor deles! Oh, as jovens, com rostos de palidez esverdeada, que guincham sobre seus pianos! Pois essa é a regra estabelecida entre nós na Rússia; um homem não pode se dedicar a uma única arte — ele deve ter todas. E assim não é de admirar que esses senhores estendam seu poderoso patrocÃnio também à literatura russa, especialmente à literatura dramática... Os Jacob Sannazars são escritos para eles; a luta do talento não apreciado contra o mundo inteiro, retratada milhares de vezes, ainda os comove profundamente...
No dia seguinte à chegada do Sr. Benevolensky, Tatyana Borissovna disse ao sobrinho, na hora do chá, para mostrar seus desenhos ao convidado.
— Ora, ele desenha? — disse o Sr. Benevolensky, com alguma surpresa, e virou-se com interesse para Andryusha.
— Sim, ele desenha — disse Tatyana Borissovna —; ele gosta tanto! E ele faz tudo sozinho, sem professor.
— Ah! Mostre-me, mostre-me! — gritou o Sr. Benevolensky.
Andryusha, corando e sorrindo, trouxe ao visitante seu caderno de esboços. O Sr. Benevolensky começou a folheá-lo com ar de conhecedor.
— Bom, jovem — ele pronunciou finalmente —; bom, muito bom.
E acariciou a cabeça de Andryusha. Andryusha interceptou sua mão e a beijou.
— Imagine só, um talento como esse!