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Boris Godunov: Um Drama em Verso

por Alexandre Sergueievitch PĂșchkin

CapĂ­tulo 1 - Parte 1

PERSONAGENS

BORIS GODUNOV, posteriormente Czar.

PRÍNCIPE SHUISKY, nobre russo.

PRÍNCIPE VOROTINSKY, nobre russo.

SHCHELKALOV, Ministro de Estado russo.

PADRE PIMEN, um velho monge e cronista.

GRIGÓRIO OTREPIEV, um jovem monge, posteriormente o Pretendente ao trono da RĂșssia.

O PATRIARCA, Abade do Mosteiro de Chudov.

MISSAIL, frade errante.

VARLAAM, frade errante.

ATANÁSIO MIKAILOVICH PÚCHKIN, amigo do Príncipe Shuisky.

FIÓDOR, jovem filho de Boris Godunov.

SEMYON NIKÍTICH GODUNOV, agente secreto de Boris Godunov.

GABRIEL PÚCHKIN, sobrinho de A. M. PĂșchkin.

PRÍNCIPE KURBSKY, nobre russo em desgraça.

KRUCHSHÓV, nobre russo em desgraça.

KARELA, um cossaco.

PRÍNCIPE VICHNEVETSKY.

MNICHEK, Governador de Sambor.

BASMÁNOV, um oficial russo.

MARGERET, oficial do Pretendente.

ROZEN, oficial do Pretendente.

DIMITRI, o Pretendente, anteriormente GrigĂłrio Otrepiev.

MOSALSKY, um boiardo.

KSÊNIA, filha de Boris Godunov.

AMA de KsĂȘnia.

MARINA, filha de Mnicchek.

RÓUZYA, camareira de KsĂȘnia.

DONA DA TAVERNA.

Boiardos, O Povo, Inspetores, Oficiais, Criados, Convidados, um Criado a serviço do PrĂ­ncipe Shuisky, um Padre CatĂłlico, um Nobre PolonĂȘs, um Poeta, um Idiota, um Mendigo, Cavalheiros, Camponeses, Guardas, Soldados Russos, Poloneses e AlemĂŁes, um Prusso Prisioneiro de Guerra, Jovens, uma Velha, Damas, Servas.

*A lista de Personagens, que nĂŁo aparece no original, foi adicionada para a conveniĂȘncia do leitor-A.H.

PALÁCIO DO KREMLIN (20 de Fevereiro, A.D. 1598)

PRÍNCIPE SHUISKY e VOROTINSKY

VOROTINSKY. — Manter a paz da cidade, essa Ă© a tarefa

— Confiada a nós dois, mas vós, na verdade,

— Tereis pouca necessidade de vigiar; Moscou está vazia;

— O povo acorreu ao Mosteiro,

— Após o Patriarca. Que pensais?

— Como terminará esta desgraça?

SHUISKY. — Como terminará?

— Isso nĂŁo Ă© difĂ­cil de dizer. Mais um pouco

— A multidão vai gemer e chorar, Boris

— Franzirá a testa por um tempo, como um beberrão

— Olhando um copo de vinho, e no final

— Humildemente de sua graça consentirá

— Em tomar a coroa; e então — e então nos governará

— Assim como antes.

VOROTINSKY. — Um mĂȘs jĂĄ se passou

— Desde que, recluso com sua irmã, ele abandonou

— Os assuntos do mundo. NinguĂ©m atĂ© agora abalou

— Seu propósito, nem o Patriarca, nem os boiardos,

— Seus conselheiros; suas lĂĄgrimas, suas oraçÔes ele nĂŁo atende;

— Surdo está ao lamento de Moscou, surdo

— À voz do Grande Conselho; em vão eles urgiram

— A triste freira-rainha a consagrar

— Boris à soberania; firme estava sua irmã,

— Inexorável como ele; creio que Boris

— A inspirou com este espírito. E se nosso governante

— Estiver realmente doente de preocupaçÔes de estado

— E não tiver forças para subir ao trono? Que

— Dizes?

SHUISKY. — Digo que, nesse caso, o sangue em vão

— Correu do jovem czarevich, que Dimitri

— Bem poderia estar vivo.

VOROTINSKY. — Crime terrível!

— EstĂĄ alĂ©m de toda dĂșvida que Boris arquitetou

— O assassinato do jovem menino?

SHUISKY. — Quem mais? Quem mais

— Subornou Chepchugov em vão? Quem enviou em segredo

— Os irmãos Bityagovsky com Kachalov?

— Eu mesmo fui enviado a Uglich, lá para investigar

— Este assunto no local; vestígios frescos lá

— Encontrei; a cidade inteira testemunhou o crime;

— Em uníssono os burgueses todos o afirmaram;

— E com uma Ășnica palavra, ao retornar,

— Eu poderia ter provado a culpa do vilão secreto.

VOROTINSKY. — Por que então não o esmagaste?

SHUISKY. — Na ocasião,

— Eu confesso, sua inesperada calma,

— Sua desfaçatez, me assombrou. Honestamente

— Ele me olhou nos olhos; ele me questionou

— De perto, e eu repeti em sua face

— A tola história que ele mesmo me sussurrara.

VOROTINSKY. — Um negócio feio, Príncipe.

SHUISKY. — Que poderia eu fazer?

— Declarar tudo a Fiódor? Mas o czar

— Via todas as coisas com os olhos de Godunov.

— Ouviu todas as coisas com os ouvidos de Godunov;

— Mesmo que eu tivesse provado plenamente,

— Boris o teria negado na hora,

— E eu teria sido levado para a prisão,

— E em devido tempo — como meu próprio tio — estrangulado

— No silĂȘncio de algum calabouço de paredes surdas.

— Não me gabo quando digo que, dada a ocasião,

— Nenhuma pena me assusta. Não sou covarde,

— Mas tambĂ©m nĂŁo sou tolo, e nĂŁo escolho

— Por livre vontade andar para a forca.

VOROTINSKY. — Atrocidade monstruosa! Escuta; garanto-te

— O remorso já rói o assassino;

— Tenha certeza de que o sangue daquela mesma criança inocente

— O impedirá de subir ao trono.

SHUISKY. — Isso nĂŁo o deterĂĄ; Boris nĂŁo Ă© tĂŁo tĂ­mido!

— Que honra para nĂłs, sim, para toda a RĂșssia!

— Um escravo de ontem, um tártaro, filho

— Por casamento de Maliuta, de um carrasco,

— Ele mesmo em alma um carrasco, ele a usar

— A coroa e o manto de Monomakh!—

VOROTINSKY. — Tendes razão;

— Ele Ă© de nascimento humilde; nĂłs dois podemos nos gabar

— De uma linhagem mais nobre.

SHUISKY. — De fato, podemos!

VOROTINSKY. — Lembremo-nos, Shuisky, Vorotinsky

— Somos, digamos, príncipes de nascimento.

SHUISKY. — Sim, príncipes de nascimento,

— E do sangue de Rurik.

VOROTINSKY. — Escuta, Príncipe;

— Então nós, parece, deveríamos ter o direito de subir

— Ao trono de Fiódor.

SHUISKY. — Em vez de Godunov.

VOROTINSKY. — Na verdade, assim parece.

SHUISKY. — E então?

— Se Boris ainda perseguir seus caminhos astutos,

— Tratemos de, por meios hábeis, incitar

— O povo. Que eles se afastem de Godunov;

— PrĂ­ncipes eles tĂȘm em abundĂąncia entre eles;

— Que eles de seu nĂșmero escolham um czar.

VOROTINSKY. — De nós, Varegues de sangue, há muitos,

— Mas nĂŁo Ă© fĂĄcil para nĂłs competir

— Com Godunov; o povo não está acostumado

— A reconhecer em nós um ramo antigo

— De seus velhos mestres guerreiros; há muito

— Já perdemos nossos apanágios,

— Há muito servimos apenas como subordinados dos czares,

— E ele soube, pelo medo, e amor, e glória,

— Como enfeitiçar o povo.

SHUISKY. (Olhando por uma janela.) — Ele ousou,

— Isso Ă© tudo — enquanto nĂłs — Basta disto. VĂȘs

— Dispersamente o povo a retornar.

— Iremos sem demora e saberemos o que foi resolvido.

A PRAÇA VERMELHA

1ÂȘ PESSOA DO POVO. — Ele Ă© inexorĂĄvel! Ele afastou de si

— Prelados, boiardos e o Patriarca; em vão

— Prostram-se; o esplendor do trono

— O assusta.

2ÂȘ PESSOA. — Ó, meu Deus, quem nos governarĂĄ?

— Ó, ai de nós!

3ÂȘ PESSOA. — Vede! O Ministro Chefe

— Está saindo para nos dizer o que o Conselho

— Acaba de resolver.

O POVO. — SilĂȘncio! SilĂȘncio! Ele fala,

— O Ministro de Estado. SilĂȘncio, silĂȘncio! Ouvi!

SHCHELKALOV. (Do BalcĂŁo Vermelho.)

— O Conselho resolveu pela Ășltima vez

— Colocar Ă  prova o poder da sĂșplica

— Sobre a alma triste de nosso governante. Ao amanhecer,

— Após um serviço solene no Kremlin,

— O bendito Patriarca irá, precedido

— Por estandartes sagrados, com os santos ícones

— De Donsky e Vladimir; com ele irão

— O Conselho, cortesãos, delegados, boiardos,

— E todo o povo ortodoxo de Moscou; todos

— Irão orar mais uma vez à rainha para ter pena

— De Moscou órfã, e para consagrar

— Boris à coroa. Agora para vossos lares

— Ide em paz: orai; e ao CĂ©u subirĂĄ

— A petição do coração dos ortodoxos.

(O POVO dispersa-se.)

CAMPO DA VIRGEM

O NOVO CONVENTO. O Povo.

1ÂȘ PESSOA. — Para suplicar Ă  czarina em sua cela

— Agora eles foram. Para lá foram Boris,

— O Patriarca, e uma hoste de boiardos.

2ÂȘ PESSOA. — Que notĂ­cias?

3ÂȘ PESSOA. — Ainda estĂĄ irredutĂ­vel; contudo hĂĄ esperança.

MULHER CAMPONESA. (Com uma criança.)

— Maldito! Pare de chorar, senão o bicho-papão

— Vai te levar. Maldito, maldito! Pare de chorar!

1ÂȘ PESSOA. — NĂŁo podemos passar por trĂĄs da cerca?

2ÂȘ PESSOA. — ImpossĂ­vel!

— Sem chance alguma! Não só o convento está

— Lotado; os arredores tambĂ©m estĂŁo cheios de gente.

— Vede que espetáculo! Toda Moscou acorreu aqui.

— Vede! Cercas, telhados e cada andar

— Da torre sineira da Catedral, as cĂșpulas das igrejas,

— As próprias cruzes estão apinhadas de gente.

1ÂȘ PESSOA. — Um belo espetĂĄculo, de fato!

2ÂȘ PESSOA. — Que barulho Ă© esse?

3ÂȘ PESSOA. — Escutai! Que barulho Ă© esse? — O povo gemeu;

— Vede lĂĄ! Eles caem como ondas, fila apĂłs fila — De novo — de novo — Agora, irmĂŁo, Ă© a nossa vez;

— SĂȘ rĂĄpido, ajoelha-te!

O POVO. (De joelhos, gemendo e lamentando-se.)

— Tende pena de nós,

— Nosso pai! Ó, governai sobre nĂłs! Ó, sĂȘ

— Pai para nós, e czar!

1ÂȘ PESSOA. (Sotto voce.) — Por que eles estĂŁo se lamentando?

2ÂȘ PESSOA. — Como podemos saber? Os boiardos sabem muito bem.

— NĂŁo Ă© da nossa conta.

MULHER CAMPONESA. (Com uma criança.)

— Ora, o que Ă© isso? Justo quando

— Devia chorar, a criança para de chorar. Eu te mostrarei!

— Lá vem o bicho-papão! Chora, chora, mimado!

(Joga-a no chão; a criança grita.)

— Isso mesmo, isso mesmo!

1ÂȘ PESSOA. — Como todo mundo estĂĄ chorando,

— NĂłs tambĂ©m, irmĂŁo, começaremos a chorar.

2ÂȘ PESSOA. — IrmĂŁo, eu tento o meu melhor, mas nĂŁo consigo.

1ÂȘ PESSOA. — Nem eu.

— Não tens uma cebola?

2ÂȘ PESSOA. — NĂŁo; molharei

— Meus olhos com cuspe. O que está acontecendo lá agora?

1ÂȘ PESSOA. — Quem sabe

— O que está havendo?

O POVO. — A coroa para ele! Ele Ă© o czar!

— Ele cedeu! — Boris! — Nosso czar! — Vida longa a Boris!

O PALÁCIO DO KREMLIN

BORIS, PATRIARCA, Boiardos

BORIS. — Tu, Padre Patriarca, todos vós, boiardos!

— Minha alma está nua diante de vós; vós vistes

— Com que humildade e temor eu tomei

— Este poderoso poder sobre mim. Ah! Quão pesado

— Meu fardo de obrigação! Eu sucedo

— Aos grandes Ivans; sucedo ao czar anjo! — Ó Pai Justo, Rei dos reis, olhai

— Do CĂ©u sobre as lĂĄgrimas de Vossos verdadeiros servos,

— E enviai sobre aquele que amastes, a quem Vós

— Exaltastes na terra tão maravilhosamente,

— Vossa santa bĂȘnção. Que eu governe meu povo

— Em glória, e como Vós seja bom e justo!

— A vós, boiardos, eu procuro ajuda. Servi-me

— Como o servistes, quando eu compartilhava vossos trabalhos,

— Antes de ser escolhido pela vontade do povo.

BOIARDOS. — Não nos afastaremos do nosso juramento.

BORIS. — Agora vamos ajoelhar-nos diante dos tĂșmulos

— Dos grandes governantes falecidos da RĂșssia. EntĂŁo

— Mandai convocar todo o nosso povo para uma festa,

— Todos, do nobre ao pobre mendigo cego.

— A todos entrada livre, todos muito bem-vindos.

(Sai, seguido pelos Boiardos.)

PRÍNCIPE VOROTINSKY. (Parando Shuisky.)

— Acertaste em cheio.

SHUISKY. — Adivinhei o quĂȘ?

VOROTINSKY. — Ora, te lembras — No outro dia, aqui mesmo neste lugar.

SHUISKY. — Não, não me lembro de nada.

VOROTINSKY. — Quando o povo

— Acorreu ao Campo da Virgem, tu disseste —

SHUISKY. — NĂŁo Ă©

— A hora de recordaçÔes. HĂĄ momentos

— Em que eu deveria aconselhar-te a não lembrar,

— Mas atĂ© a esquecer. E quanto ao resto,

— Procurei apenas com falsa calĂșnia provar-te,

— Para discernir melhor teus pensamentos secretos.

— Mas vede! O povo saĂșda o czar — minha ausĂȘncia

— Pode ser notada. Juntar-me-ei a eles.

VOROTINSKY. — CortĂȘs astuto!

NOITE

Cela no Mosteiro de Chudov (A.D. 1603)

PADRE PIMEN, GRIGÓRIO (dormindo)

PIMEN (Escrevendo diante de uma lamparina sagrada.)

— Mais um, o registro final, e meus anais

— Estão terminados, e cumprido o dever imposto

— Por Deus a mim, um pecador. Não em vão

— Deus me designou por muitos anos

— Uma testemunha, ensinando-me a arte das letras;

— Um dia virá em que algum monge laborioso

— Trará à luz meu zeloso e anînimo trabalho,

— Acenderá, como eu, sua lamparina, e do pergaminho

— Sacudindo a poeira dos sĂ©culos transcreverĂĄ

— Minhas verdadeiras narraçÔes, para que a posteridade

— As fortunas passadas dos ortodoxos

— De sua própria terra possa aprender, fará menção

— De seus grandes czares, seus trabalhos, glória, bondade —

— E humildemente por seus pecados, seus atos maus,

— Implorará a misericórdia do Salvador. — Na velhice

— Eu vivo de novo; o passado se desenrola diante de mim. — Será que em anos há muito passados se esvaiu,

— Cheio de eventos, e agitado como o fundo?

— Agora está silenciado e tranquilo. Poucos os rostos

— Que a memória salvou para mim, e poucas

— As palavras que me chegaram; — o resto

— Pereceu, para nunca mais voltar. — Mas o dia

— Se aproxima, a lamparina queima baixo, mais um registro,

— O Ășltimo. (Ele escreve.)

GRIGÓRIO. (Despertando.) — Sempre o mesmo sonho! É possível?

— Pela terceira vez! Sonho maldito! E sempre

— Diante da lamparina senta o velho e escreve —

— E nem toda a noite, parece, de sonolĂȘncia,

— Fechou os olhos. Amo a visão pacífica,

— Quando, com a alma imersa no passado,

— Ele mantĂ©m sua crĂŽnica. Muitas vezes desejei

— Adivinhar sobre o que ele escreve. Será, por acaso,

— O sombrio domínio dos tártaros? Será

— Os castigos sombrios de Ivan, o tempestuoso Conselho de Novgorod? É sobre a glória

— De nossa querida pátria? — Pergunto em vão!

— Nem em sua fronte altiva, nem em seus olhares

— Podemos ler seus pensamentos secretos; sempre

— O mesmo aspecto; humilde e ao mesmo tempo altivo —

— Como algum Ministro de Estado envelhecido no cargo,

— Calmamente ele contempla o justo

— E o culpado, com indiferença ele ouve

— O mal e o bem, e não conhece ira nem piedade.

PIMEN. — Despertaste, irmão?

GRIGÓRIO. — Honrado Pai, dai-me

— Vossa bĂȘnção.

PIMEN. — Que Deus te abençoe neste dia,

— Amanhã, e para sempre.

GRIGÓRIO. — A noite inteira

— Tu estiveste escrevendo e abstive-te de dormir,

— Enquanto visĂ”es demonĂ­acas perturbaram minha paz,

— O demînio me molestou. Sonhei que subia

— Por escadas em espiral uma torre, de cuja altura

— Moscou parecia um formigueiro, onde o povo

— Fervilhava nas praças abaixo e apontava para mim

— Com risos. Vergonha e terror me invadiram —

— E caindo de cabeça, acordei. TrĂȘs vezes

— Sonhei o mesmo sonho. NĂŁo Ă© estranho?

PIMEN. — É o sangue jovem em ação; humilha-te

— Pela oração e pelo jejum, e as visĂ”es de teu sono

— SerĂŁo todas cheias de leveza. AtĂ© agora,

— Se eu, involuntariamente enfraquecido pela sonolĂȘncia,

— NĂŁo faço longas oraçÔes Ă  noite,

— Meu sono de velho nĂŁo Ă© calmo nem sem pecado;

— Agora aparecem festas tumultuosas, agora acampamentos de guerra,

— Conflitos de batalha, diversĂ”es fĂșteis

— Dos anos juvenis.

GRIGÓRIO. — Com que alegria tu

— Viveste tua juventude! A fortaleza de Kazan

— Tu combateste sob ela, com Shuisky repeliste

— O exĂ©rcito da LituĂąnia. Tu viste a corte,

— E o esplendor de Ivan. Ah! Feliz tu!

— Enquanto eu, desde a infñncia, um miserável monge,

— Vago de cela em cela! Por que a mim

— Não me foi dado jogar o jogo da guerra,

— Banquetear-me à mesa de um czar?

— Então, como tu, eu na minha velhice

— Com prazer me teria retirado do mundo barulhento,

— Para me dedicar a ser monge,

— E no claustro tranquilo terminar meus dias.

PIMEN. — Não te queixes, irmão, que o mundo pecaminoso

— Tu cedo abandonaste, que poucas tentaçÔes

— O Altíssimo te enviou. Acredita em minhas palavras;

— A glória do mundo, seu luxo,

— O amor sedutor da mulher, visto de longe,

— Escraviza nossas almas. Longo tempo vivi, tomei

— Prazer em muitas coisas, mas nunca conheci

— Verdadeira bem-aventurança atĂ© aquela estação em que o Senhor

— Me guiou ao claustro. Pensa, meu filho,

— Nos grandes czares; quem mais elevado que eles?

— SĂł Deus. Quem ousa contrariĂĄ-los? NinguĂ©m. E entĂŁo?

— Muitas vezes a coroa de ouro tornou-se para eles

— Um fardo; por um capuz a trocaram.

— O czar Ivan buscou no trabalho monástico

— Tranquilidade; seu palácio, outrora cheio

— De capangas altivos, tornou-se em tudo

— Um mosteiro; os próprios libertinos pareciam

— Monges obedientes, o terrível czar aparecia

— Um piedoso abade. Aqui, nesta mesma cela (Naquela Ă©poca, Cirilo, o muito sofredor,

— Um homem justo, nela habitava; atĂ© a mim

— Deus então me fez compreender o nada

— Das vaidades mundanas), aqui eu vi,

— Cansado de pensamentos irados e execuçÔes,

— O czar; entre nós, meditativo, quieto

— Aqui se sentava o Terrível; nós, imóveis,

— Estávamos em sua presença, enquanto ele falava conosco

— Em tons tranquilos. Assim ele falou ao abade

— E a todos os irmãos: — Meus pais, em breve virá

— O dia tão esperado; aqui eu estarei diante de vós,

— Com fome de salvação; Nicodemo,

— Tu SĂ©rgio, tu Cirilo, todos aceitareis

— Meu voto espiritual; a vós em breve virei

— Amaldiçoado em pecado, aqui o hábito limpo tomarei,

— Prostrado, santĂ­ssimo pai, a vossos pĂ©s.

— Assim falou o senhor soberano, e de seus lábios

— Docemente fluíram os acentos. Ele chorou; e nós

— Com lágrimas pedimos a Deus que enviasse Seu amor e paz

— Sobre sua alma sofredora e tempestuosa. — E seu filho Fiódor? No trono

— Ele suspirou por levar uma vida de calma devoção.

— Os aposentos reais em uma cela de oração

— Ele transformou, onde os pesados cuidados de estado

— Não afligiam sua santa alma. Deus passou a amar

— A humildade do czar; em seus bons dias

— A RĂșssia foi abençoada com glĂłria inabalĂĄvel,

— E na hora de seu falecimento ocorreu

— Um milagre inaudito; ao seu leito,

— Visto apenas pelo czar, apareceu um ser

— Excedente em brilho, com quem Fiódor começou

— A se comunicar, chamando-o de grande Patriarca; —

— E todos ao redor dele foram tomados de medo,

— Meditando sobre a visĂŁo enviada do CĂ©u,

— JĂĄ que naquela Ă©poca o Patriarca nĂŁo estava presente

— Na igreja diante do czar. E quando ele morreu

— O palácio ficou cheio de santa fragrñncia.

— E como o sol sua fisionomia resplandecia.

— Nunca mais veremos tal czar. — Ó, horrível, terrível desgraça! Pecamos,

— Iramos a Deus; escolhemos para nosso governante

— Um assassino de czar.

GRIGÓRIO. — Honrado Pai, há muito

— Desejo perguntar-vos sobre a morte

— Do jovem Dimitri, o czarevich; vós, dizem,

— Estáveis então em Uglich.

PIMEN. — Sim, meu filho,

— Eu bem me lembro. Foi Deus quem me levou

— A testemunhar aquela má ação, aquele pecado sangrento.

— Eu naquela Ă©poca fui enviado a Uglich distante

— Em alguma missão. Cheguei à noite.

— Na manhã seguinte, à hora da santa missa,

— Ouvi de repente um sino tocar; era o sino de alarme. Então um grito, um tumulto;

— Homens correndo para a corte da czarina.

— Para lá me apressei, e já havia acorrido

— Toda Uglich. Lá vejo o jovem czarevich

— Jazendo massacrado: a rainha-mãe em desmaio

— Curvada sobre ele, sua ama em seu desespero

— Lamentando-se; e então o povo enlouquecido arrasta

— A ama ímpia e traiçoeira para longe. Aparece

— De repente no meio deles, selvagem, pálido de raiva,

— Judas Bityagovsky. — Ali, ali está o vilão!

— Gritam de todos os lados a multidão, e num piscar

— Ele não existia mais. Imediatamente o povo correu

— Sobre os trĂȘs assassinos em fuga; eles agarraram

— Os malfeitores escondidos e os levaram

— Ao cadáver ainda quente da criança; quando eis! Uma maravilha —

— A criança morta de repente começou a tremer!

— Confessai! — o povo trovejou; e em terror

— Sob o machado os vilĂ”es confessaram —

— E nomearam Boris.

GRIGÓRIO. — Quantos verĂ”es viveu

— O menino assassinado?

PIMEN. — Sete verĂ”es; ele agora teria (Desde entĂŁo passaram dez anos — nĂŁo, mais — doze anos)

— A mesma idade que tu,

— E teria reinado; mas Deus julgou de outro modo.

— Esta Ă© a histĂłria lamentĂĄvel com a qual

— Minha crînica termina; desde então pouco

— Me envolvi em assuntos mundanos. Irmão Grigório,

— Tu iluminaste tua mente com estudo sĂ©rio;

— A ti eu entrego minha tarefa. Em horas livres

— Do exercício da alma, tu registrarás,

— Não sutilmente raciocinando, todas as coisas às quais

— Serás testemunha na vida; guerra e paz,

— O domínio dos reis, os santos milagres

— Dos santos, todas as profecias e sinais celestiais; —

— Para mim Ă© hora de descansar e apagar minha lamparina. —

— Mas escuta! O sino da manhã. Abençoai, Senhor, Vossos servos!

— Dai-me minha muleta.

(Sai.)

GRIGÓRIO. — Boris, Boris, diante de ti

— Todos tremem; ninguĂ©m ousa sequer lembrar-te

— Do que aconteceu à criança infeliz; enquanto isso

— Aqui, numa cela escura, um eremita escreve

— Tua severa denĂșncia. Tu nĂŁo escaparĂĄs

— Do julgamento nem deste mundo,

— Como não escaparás da condenação de Deus.

MURO DO MOSTEIRO* *Esta cena foi omitida por Pushkin da versão publicada da peça.

GRIGÓRIO e um Monge Perverso

GRIGÓRIO. — Ó, que cansaço Ă© nossa pobre vida,

— Que misĂ©ria! O dia vem, o dia vai, e sempre

— Se vĂȘ, se ouve uma sĂł coisa; sĂł se vĂȘ

— Só batinas pretas, só se ouve o sino.

— Bocejando de dia tu vagueias, vagueias, nada

— Para fazer; tu cochilas; a noite inteira atĂ© o amanhecer

— O pobre monge fica acordado; e quando no sono

— Tu te perdes, sonhos negros perturbam a alma;

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