CapĂtulo 1 â Parte 1
DEDICATĂRIA
Bob Southey! Ăs um poeta, poeta laureado,
E representante de toda a tua laia.
Embora seja verdade que te tornaste um Tory,
Ultimamente, o teu caso Ă© comum.
E agora, meu épico renegado, que andas a fazer
Com todos os lacustres, por aqui e por ali?
Um ninho de gente melodiosa, a meu ver,
Como vinte e quatro melros numa tarte,
Que, aberta a tarte, começaram a cantarâ (Esta velha canção e nova semelhança sĂŁo boas), âUm prato delicioso para apresentar ao Reiâ
Ou Regente, que admira tal manjar.
E Coleridge também se lançou em voo ultimamente,
Mas como um falcĂŁo com o capuz a tolher-lhe o voo,
Explicando metafĂsica Ă nação.
Desejo que ele explique a sua explicação.
Tu, Bob, és assaz insolente, sabes bem,
Ao veres frustrado o teu desejo
De suplantar todos os cantores neste mundo,
E ser o Ășnico melro no prato.
E assim, te esforças em demasia, ou algo parecido,
E cais como o peixe voador
Ofegante no convés, porque voas muito alto, Bob,
E cais por falta de humidade, um Bob seco e ressequido.
E Wordsworth numa assaz longa *ExcursĂŁo* (Penso que o quarto volume tem quinhentas pĂĄginas)
Deu uma amostra da sua vasta versĂŁo
Do seu novo sistema para perplexar os sĂĄbios.
à poesia, pelo menos por sua própria afirmação,
E pode parecer assim quando a Estrela CĂŁo se enfurece,
E quem a compreendesse seria capaz
De acrescentar um andar Ă torre de Babel.
Vós, cavalheiros, por força de uma longa reclusão
Longe de melhor companhia, mantivestes a vossa
Em Keswick, e atravĂ©s da contĂnua fusĂŁo
Das mentes uns dos outros, por fim, chegastes
Ă conclusĂŁo, a mais lĂłgica,
De que a poesia tem grinaldas apenas para vĂłs.
Hå uma estreiteza em tal noção,
Que me faz desejar que troqueis os lagos pelo oceano.
NĂŁo imitaria um pensamento tĂŁo mesquinho,
Nem transformaria o meu amor-prĂłprio em vĂcio tĂŁo vil,
Por toda a glĂłria que a vossa conversĂŁo vos trouxe,
Pois só o ouro não deveria ter sido o seu preço.
Tendes o vosso soldo; foi por isso que labutastes?
E Wordsworth tem o seu lugar na AlfĂąndega.
Sois sujeitos desleixados â Ă© verdade â mas poetas ainda
E devidamente sentados na colina imortal.
Vossos louros podem esconder a calvĂcie das vossas frontes,
Talvez alguns pudores virtuosos; deixai-os ir.
NĂŁo vos invejo fruto nem ramos,
E pela fama que quereis monopolizar neste mundo,
O campo Ă© universal e permite
Espaço a todos os que sentem o brilho que lhes é inerente.
Scott, Rogers, Campbell, Moore e Crabbe disputarĂŁo convosco a questĂŁo perante a posteridade.
Quanto a mim, que, vagando com Musas pedestres,
NĂŁo rivalizo convosco no corcel alado,
Desejo que o vosso destino vos conceda, quando bem lhe aprouver,
A fama que invejais e a perĂcia de que precisais.
E recordai que um poeta nada perde
Ao dar aos seus irmĂŁos o seu devido quinhĂŁo
De mérito, e a queixa dos dias atuais
NĂŁo Ă© o caminho para o louvor futuro.
Aquele que reserva os seus louros para a posteridade (Quem, nĂŁo raro, reclama a brilhante reversĂŁo)
Geralmente nĂŁo tem grande colheita a poupar,
Sendo apenas prejudicado pela sua própria presunção.
E embora aqui e ali alguma gloriosa raridade
Surja como TitĂŁ emergindo do mar,
A maior parte desses que apelam vai
Para â Deus sabe onde â pois ninguĂ©m mais pode saber.
Se caĂdo em dias maus, sob lĂnguas maledicentes,
Milton apelou ao Tempo vingador,
Se o Tempo, o vingador, execra os seus detratores
E faz a palavra miltoniana significar sublime,
Ele nĂŁo se dignou a trair a sua alma em cĂąnticos,
Nem a transformar o seu prĂłprio talento num crime.
Ele nĂŁo detestou o pai para louvar o filho,
Mas permaneceu o odiador de tiranos que foi no inĂcio.
Poderia ele, pensas tu, o velho cego, erguer-se
Como Samuel da sepultura para gelar de novo
O sangue dos monarcas com as suas profecias,
Ou estar vivo novamente â novamente todo grisalho
Pelo tempo e pelas provaçÔes, e aqueles olhos sem amparo
E filhas desalmadas â gasto e pĂĄlido e pobre,
Adoraria ele um sultĂŁo? Obedeceria ao
Eunuco intelectual Castlereagh?
MiserĂĄvel de sangue frio, de rosto liso e plĂĄcido!
Molhando suas lisas mĂŁos jovens no sangue de Erin,
E assim, ensinado a ofegar por maior carnificina,
Transferido para banquete em costa irmĂŁ,
A ferramenta mais vulgar que a tirania poderia desejar,
Com talento suficiente e nada mais,
Para alongar algemas jĂĄ fixadas por outrem
E oferecer veneno hĂĄ muito jĂĄ misturado.
Um orador de fraseologia tĂŁo gasta e torpe,
Inerentemente vil, legitimamente,
Que nem os seus mais grosseiros aduladores ousam louvĂĄ-lo,
Nem os inimigos â todas as naçÔes â se dignam a sorrir.
Nem mesmo a faĂsca de um erro animoso pode brilhar
Daquele incessante labor de amolar de Ăxion,
Que gira e gira para dar ao mundo a noção
De tormentos infinitos e movimento perpétuo.
Um trapalhĂŁo mesmo no seu ofĂcio asqueroso,
E remendando, emendando, deixando sempre por fazer
Algo de que os seus mestres tĂȘm medo,
Estados a controlar e pensamentos a confinar,
Conspiração ou congresso a formar-se,
Remendando algemas para toda a humanidade,
Um fazedor de escravos remendĂŁo, que remenda cadeias antigas,
Com o enfado de Deus e dos homens pelos seus ganhos.
Se pela mente a matéria podemos julgar,
Emasculada até à medula, ela
Tem apenas dois objetivos: servir e prender,
Crendo que as grilhetas que usa
Até os homens podem ajustar,
EutrĂłpio de seus muitos mestres, cega
Ao valor como Ă liberdade, Ă sabedoria como Ă sagacidade,
Destemida, porque nenhum sentimento reside no gelo;
Sua prĂłpria coragem estagna num vĂcio.
Para onde me voltarei para não ver os seus grilhÔes,
Pois nunca os sentirei. ItĂĄlia,
Tua alma romana, tardiamente reavivada, desespera
Sob a mentira que este Estado-coisa soprou sobre ti.
Tua ruidosa cadeia e as ainda frescas feridas de Erin
TĂȘm vozes, lĂnguas para clamar por mim.
A Europa ainda tem escravos, aliados, reis, exércitos,
E Southey vive para os mal cantar.
Entretanto, Senhor Laureado, procedo à dedicação
Desta canção a ti, em verso franco e simples.
E se em verso nĂŁo te lisonjeio,
Ă porque ainda mantenho o meu bege e azul;
Minha polĂtica ainda estĂĄ por educar.
A apostasia estå tão em moda também,
Manter um credo Ă© uma tarefa que se tornou assaz HercĂșlea.
NĂŁo Ă© assim, meu Tory, ultra-Juliano?
CANTO PRIMEIRO
Quero um herĂłi: um desejo incomum,
Quando cada ano e mĂȘs traz um novo,
Até que, depois de enfadar as gazetas com hipocrisia,
A época descobre que ele não é o verdadeiro herói;
De tais, nĂŁo me atreveria a gabar-me,
Tomarei, portanto, o nosso velho amigo Dom Juan â
Todos o vimos, na pantomima,
Enviado ao diabo um tanto antes de seu tempo.
Vernon, Cumberland, o carniceiro, Wolfe, Hawke,
PrĂncipe Fernando, Granby, Burgoyne, Keppel, Howe,
O mal e o bem, tiveram sua dose de conversa,
E encheram os seus letreiros entĂŁo, como agora Wellesley;
Cada um por sua vez, espreita como os monarcas de Banquo,
Seguidores da fama, «nove leitÔes» daquela porca:
A França, também, teve Bonaparte e Dumourier
Registados no *Moniteur* e *Courier*.
Barnave, Brissot, Condorcet, Mirabeau,
Petion, Clootz, Danton, Marat, La Fayette,
Eram franceses, e personagens famosos, como sabemos:
E havia outros, ainda mal esquecidos,
Joubert, Hoche, Marceau, Lannes, Desaix, Moreau,
Com muitos do meio militar,
Extremamente notĂĄveis noutros tempos,
Mas de forma alguma aptos para as minhas rimas.
Nelson foi outrora o deus da guerra da BritĂąnia,
E ainda deveria ser, mas a maré mudou;
Nada mais hĂĄ a dizer de Trafalgar,
Jaz com o nosso herĂłi, silenciosamente inumado;
Porque o exército se tornou mais popular,
O que preocupa o pessoal naval;
AlĂ©m disso, o prĂncipe Ă© todo a favor do serviço em terra,
Esquece Duncan, Nelson, Howe e Jervis.
Homens corajosos viveram antes de Agamemnon,
E depois, homens extremamente valorosos e sĂĄbios,
Muitos parecidos com ele, embora nenhum exatamente a ele igual;
Mas entĂŁo nĂŁo brilharam na pĂĄgina do poeta,
E assim foram esquecidos: â NĂŁo condeno ninguĂ©m,
Mas não consigo encontrar ninguém na era presente
Apto para o meu poema (isto Ă©, para o meu novo);
EntĂŁo, como eu disse, tomarei o meu amigo Dom Juan.
A maioria dos poetas épicos mergulha *in medias res*
(HorĂĄcio faz disto o caminho real e heroico),
E entĂŁo o teu herĂłi conta, quando bem lhe aprouver,
O que aconteceu antes â a tĂtulo de episĂłdio,
Enquanto sentado apĂłs o jantar Ă sua vontade,
Ao lado da sua amante num aposento suave,
PalĂĄcio, ou jardim, paraĂso, ou caverna,
Que serve de taberna ao feliz casal.
Esse Ă© o mĂ©todo usual, mas nĂŁo o meu. â
Meu modo Ă© começar pelo princĂpio;
A regularidade do meu projeto
ProĂbe divagaçÔes como o pior dos pecados,
E, portanto, abrirei com um verso (Embora me custasse meia hora a urdi-lo)
Narrando algo sobre o pai de Dom Juan,
E também sobre a sua mãe, se preferires.
Em Sevilha nasceu ele, uma cidade agradĂĄvel,
Famosa por laranjas e mulheres. â Aquele
Que nĂŁo a viu serĂĄ de muito lamentar,
Assim diz o provĂ©rbio â e concordo plenamente;
De todas as cidades espanholas, nenhuma Ă© mais bonita. CĂĄdis, talvez. â
Mas isso logo verĂĄs;
Os pais de Dom Juan habitavam Ă beira de um rio,
Um rio nobre, de nome Guadalquivir.
O nome do pai era JosĂ© â Dom, claro â
Um verdadeiro Hidalgo, livre de qualquer mancha
De sangue mouro ou hebreu, ele traçava a sua origem
Através dos mais góticos fidalgos da Espanha;
Melhor cavaleiro nunca montou a cavalo,
Ou, estando montado, nunca mais dele desceu,
Que José, que gerou o nosso herói, que
Gerou â mas isso estĂĄ por vir. â Bem, para retomar:
Sua mĂŁe era uma senhora erudita, afamada
Por cada ramo de cada ciĂȘncia conhecida
Em cada lĂngua cristĂŁ jĂĄ nomeada,
Com virtudes igualadas apenas pela sua argĂșcia,
Ela fez as mais inteligentes pessoas corarem de vergonha,
E até os bons gemiam interiormente de inveja,
Encontrando-se tĂŁo superados, Ă sua maneira, por tudo o que ela fazia.
Sua memĂłria era uma mina: ela sabia de cor
Todo CalderĂłn e a maior parte de Lope,
De modo que se algum ator errasse a sua parte
Ela poderia ter-lhe servido de ponto;
Para ela, a arte de Feinagle era inĂștil,
E ele prĂłprio obrigado a fechar a loja. â Ele
Nunca poderia criar uma memĂłria tĂŁo fina
Como a que adornava o cérebro de Donna Inez.
Sua ciĂȘncia favorita era a MatemĂĄtica;
Sua virtude mais nobre era sua magnanimidade,
Sua sagacidade (ela Ă s vezes tentava ser sagaz) era toda Ătica,
Seus ditos sérios atingiam a sublimidade;
Em suma, em tudo ela era o que eu chamo de um prodĂgio. â
Seu vestido matinal era de *dimity*,
Sua seda noturna, ou, no verĂŁo, musseline,
E outros tecidos, com os quais não me deterei a quebrar a cabeça.
Ela sabia latim â isto Ă©, «o Pai Nosso» â
E grego â o alfabeto â quase tenho certeza;
Ela lia alguns romances franceses por aqui e por ali,
Embora seu modo de falar nĂŁo fosse o mais puro;
Pelo espanhol nativo ela não nutria grande apreço,
Pelo menos sua conversação era obscura;
Seus pensamentos eram teoremas, suas palavras um problema,
Como se ela julgasse que o mistério os enobreceria.
Ela gostava das lĂnguas inglesa e hebraica,
E dizia que havia uma analogia entre elas;
Ela provou isso de alguma forma por meio de cĂąnticos sagrados,
Mas devo deixar as provas para quem as viu;
Mas isto ouvi-a dizer, e nĂŁo pode estar errado,
E todos podem pensar para que lado seus juĂzos se inclinam:
â «à estranho â o substantivo hebraico que significa âEu souâ,
Os ingleses sempre usam para governar dâo.»
Algumas mulheres usam as suas lĂnguas. â Ela parecia uma aula,
Cada olho um sermĂŁo, e a sua testa uma homilia,
Uma autossuficiente diretora,
Como o lamentado falecido Sir Samuel Romilly,
O expositor da Lei, e o reformador do Estado,
Cujo suicĂdio foi quase uma anomalia. â
Mais um triste exemplo de que «Tudo é vaidade»
(O jĂșri deu o seu veredito de «Insanidade»).
Em suma, ela era uma calculadora ambulante,
Os romances de Miss Edgeworth saltavam das suas capas,
Ou os livros de Mrs. Trimmer sobre educação,
Ou a «Esposa de Coelebs» em busca de um marido,
A personificação da moralidade por excelĂȘncia,
Em que nem a prĂłpria Inveja descobria uma falha;
Para a parte das outras, que «erros femininos caiam»,
Pois ela nĂŁo tinha sequer um. â O pior de todos.
Oh! ela era perfeita sem paralelo. â
Em comparação com qualquer santa moderna;
TĂŁo acima dos astutos poderes do Inferno,
Seu anjo da guarda havia desistido de sua guarda;
Até seus movimentos mais minuciosos funcionavam com a mesma precisão
Quanto os do melhor relĂłgio feito por Harrison:
Em virtudes, nada terrestre poderia superĂĄ-la,
Salvo o teu «óleo incomparåvel», Macassar!
Perfeita ela era, mas como a perfeição é
InsĂpida neste nosso mundo perverso,
Onde os nossos primeiros pais nunca aprenderam a beijar
Até serem exilados dos seus primeiros recantos,
Onde tudo era paz, e inocĂȘncia, e bem-aventurança
(Pergunto-me como passaram as doze horas),
Dom JosĂ©, como um legĂtimo filho de Eva,
Andou colhendo frutos variados sem a permissĂŁo dela.
Ele era um mortal do tipo descuidado,
Sem grande amor pelo saber ou pelos sĂĄbios,
Que escolhia ir para onde bem lhe aprouvesse,
E nunca sonhou que sua senhora se preocupasse;
O mundo, como de costume, maldosamente inclinado
A ver um reino ou uma casa derrubada,
Sussurrava que ele tinha uma amante, alguns diziam duas. â
Mas para contendas domésticas, uma bastarå.
Ora, D. Inez tinha, com todo o seu mérito,
Grande opiniĂŁo das suas prĂłprias qualidades;
O desprezo, de facto, exige um santo para o suportar,
E tal, de facto, ela era nas suas moralidades;
Mas entĂŁo ela tinha um espĂrito endiabrado,
E Ă s vezes misturava fantasias com a realidade,
E deixava poucas oportunidades escaparem
De meter seu senhor em apuros.
Isso era fĂĄcil com um homem
Muitas vezes em erro, e nunca em guarda;
E mesmo os mais sĂĄbios, por mais que se esforcem,
TĂȘm momentos, horas e dias tĂŁo despreparados,
Que poderias «esmagar-lhes o cérebro com o leque da sua senhora»;
E às vezes as senhoras batem com força extrema,
E os leques transformam-se em alfanjes nas mĂŁos delicadas,
E ninguĂ©m entende porquĂȘ e para quĂȘ.
Ă uma pena que virgens eruditas se casem
Alguma vez com pessoas sem educação alguma,
Ou cavalheiros que, embora bem-nascidos e educados,
Se cansam de conversas eruditas:
NĂŁo escolho dizer muito sobre este assunto,
Sou um homem simples, e numa só posição,
Mas â Oh! vĂłs, senhores de damas intelectuais,
Dizei-nos a verdade: nĂŁo vos dominaram todas?
Dom JosĂ© e sua senhora discutiram. â PorquĂȘ,
Nenhum dos muitos o pĂŽde adivinhar,
Embora vĂĄrios milhares de pessoas quisessem tentar,
Certamente nĂŁo era problema deles nem meu;
Detesto esse baixo vĂcio â a curiosidade;
Mas se hĂĄ algo em que me destaco,
Ă em arranjar todos os assuntos dos meus amigos,
Não tendo os meus próprios cuidados domésticos.
E assim me intrometi, e com as melhores
IntençÔes, mas o seu tratamento não foi gentil;
Penso que as pessoas tolas estavam possuĂdas,
Pois nenhum dos dois pude jamais encontrar,
Embora o seu porteiro depois confessasse. â
Mas isso nĂŁo importa, e o pior estĂĄ por vir,
Pois o pequeno Juan atirou-me, escada abaixo,
Um balde de ĂĄgua de criada, sem querer.
Um pequeno, de cabeça encaracolada, inĂștil,
E macaco traquina desde o nascimento;
Seus pais nunca concordaram, exceto para idolatrar
O duende mais inquieto da terra;
Em vez de brigar, se ambos estivessem no seu juĂzo, teriam enviado o jovem mestre
Para a escola, ou o teriam açoitado severamente em casa,
Para lhe ensinar bons modos para o futuro.
Dom José e Dona Inez levaram, por algum tempo,
Uma espécie de vida infeliz,
Desejando um ao outro, nĂŁo divorciados, mas mortos;
Viviam respeitosamente como marido e mulher,
Sua conduta era extremamente recatada,
E nĂŁo davam sinais externos de discĂłrdia interna,
Até que, por fim, o fogo abafado irrompeu,
E pĂŽs o assunto acima de qualquer dĂșvida.
Pois Inez chamou alguns farmacĂȘuticos e mĂ©dicos,
E tentou provar que o seu amado senhor estava louco;
Mas como ele tinha alguns intervalos de lucidez,
Ela entĂŁo decidiu que ele era apenas mau;
Contudo, quando lhe pediram as suas declaraçÔes,
Nenhuma explicação pÎde ser obtida,
Salvo que o seu dever para com Deus e o homem
Requeriam esta conduta â o que parecia sobremaneira estranho.
Ela mantinha um diĂĄrio onde as suas falhas eram anotadas,
E abriu certos baĂșs de livros e cartas,
Tudo o que, se a ocasiĂŁo o exigisse, poderia ser citado;
E entĂŁo ela tinha toda Sevilha como cĂșmplice,
Além de sua boa avó (que a adorava);
Os ouvintes do seu caso tornaram-se repetidores,
Depois advogados, inquisidores e juĂzes,
Alguns por diversĂŁo, outros por velhas queixas.
E entĂŁo esta mulher, a melhor e mais fraca, suportou
Com tamanha serenidade os padecimentos do seu marido,
Assim como as damas espartanas de outrora,
Que viam os seus esposos mortos, e nobremente escolhiam
Nunca mais dizer uma palavra sobre eles. â
Calmamente ela ouvia cada calĂșnia que surgia,
E via as suas agonias com tal sublimidade,
Que todo o mundo exclamava: «Que magnanimidade!»
Sem dĂșvida esta paciĂȘncia, quando o mundo nos condena,
Ă filosĂłfica nos nossos antigos amigos;
Também é agradåvel ser considerado magnùnimo,
Mais ainda, ao alcançar os nossos próprios fins;
E o que os advogados chamam de *malus animus*
Tal conduta de forma alguma compreende;
A vingança pessoal certamente não é virtude,
Mas entĂŁo nĂŁo Ă© minha culpa, se outros te magoam.
E se as vossas brigas desenterrarem velhas histĂłrias,
E as ajudarem com uma ou duas mentiras adicionais,
NĂŁo sou culpado, como bem sabeis â nem mais ninguĂ©m â
Elas tinham-se tornado tradicionais;
Além disso, a sua ressurreição ajuda as nossas glórias
Por contraste, que Ă© o que todos nĂłs desejĂĄvamos:
E a ciĂȘncia lucra com esta ressurreição. â
Escùndalos mortos formam bons temas para dissecção.
Seus amigos tentaram a reconciliação,
Depois seus parentes, que pioraram as coisas.
(Seria difĂcil dizer, em ocasiĂŁo semelhante,
A quem seria melhor recorrer. â
NĂŁo posso dizer muito por amigos ou parentes):
Os advogados fizeram o mĂĄximo pelo divĂłrcio,
Mas mal uma taxa fora paga de qualquer lado
Antes que, infelizmente, Dom José morresse.
Morreu ele; e muito infelizmente, porque,
Segundo todas as dicas que pude recolher
De advogados versados nesses tipos de leis
(Embora a conversa deles seja obscura e circunspecta),
Sua morte conseguiu estragar uma encantadora causa;
Mil pĂȘsames tambĂ©m no que toca
Ao sentimento pĂșblico, que nesta ocasiĂŁo
Manifestou-se numa grande sensação.
Mas, ah! ele morreu; e com ele jaziam
O sentimento pĂșblico e as taxas dos advogados:
Sua casa foi vendida, seus servos despedidos,
Um Judeu levou uma de suas duas amantes,
Um padre a outra. â Pelo menos Ă© o que dizem.
Perguntei aos mĂ©dicos sobre sua doença. â
Ele morreu da febre lenta, chamada terçã,
E deixou sua viĂșva Ă sua prĂłpria aversĂŁo.
Contudo, José era um homem honrado,
Isso devo dizer, eu que o conhecia tĂŁo bem;
Portanto, suas fraquezas nĂŁo mais investigarei,
Na verdade, nĂŁo havia muitas mais a contar;
E se suas paixÔes de vez em quando ultrapassavam
A discrição, e nĂŁo eram tĂŁo pacĂficas
Como as de Numa (que também se chamava Pompilius),
Ele tinha sido mal-educado, e nasceu bilioso.
Qualquer que fosse seu desvalor ou valor,
Pobre sujeito! ele tinha muitas coisas para o afligir.
Admitamo-lo â jĂĄ que nĂŁo pode fazer bem na terra â
Dura foi a hora em que o encontrou
De pé, sozinho, junto à sua lareira desolada,
Onde todos os seus deuses domésticos jaziam em cacos à sua volta:
Nenhuma escolha restava aos seus sentimentos ou ao seu orgulho,
Salvo a morte ou os Doctorsâ Commons â e assim morreu.
Morrendo intestado, Juan era o Ășnico herdeiro
De um processo no Tribunal de Chancelaria, de herdades e terras,
Que, com uma longa menoridade e o devido cuidado,
Prometiam resultar bem em mĂŁos apropriadas:
Inez tornou-se a Ășnica guardiĂŁ, o que era justo,
E respondia apenas Ă s justas demandas da natureza;
Um filho Ășnico deixado com uma sĂł mĂŁe
Ă criado muito mais sabiamente do que um outro.
Mais sĂĄbia das mulheres, mesmo entre as viĂșvas, ela
Resolveu que Juan deveria ser um verdadeiro modelo,
E digno da mais nobre linhagem
(Seu pai era de Castela, sua mĂŁe de AragĂŁo):
Então, para as realizaçÔes cavalheirescas,
Caso nosso senhor o rei voltasse Ă guerra,
Ele aprendeu as artes de montar, esgrima, artilharia,
E como escalar uma fortaleza â ou um convento.
Mas o que Dona Inez mais desejava,
E via em si mesma a cada dia,
Antes de todos os tutores eruditos que para ele contratara,
Era que a sua educação fosse rigorosamente moral;
Muito em todos os seus estudos ela indagava,
E assim foram submetidos primeiro a ela, todos eles,
Artes, ciĂȘncias, nenhum ramo foi feito mistĂ©rio
Aos olhos de Juan, exceto a histĂłria natural.
As lĂnguas, especialmente as mortas,
As ciĂȘncias, e sobretudo as abstrusas,
As artes, pelo menos todas aquelas que podiam ser ditas
As mais remotas do uso comum,
Em tudo isso ele era muito e profundamente versado;
Mas nem uma pĂĄgina de qualquer coisa que fosse leviana,
Ou que insinuasse a continuação da espécie,
Foi alguma vez permitida, para que ele nĂŁo caĂsse no vĂcio.
Seus estudos clĂĄssicos causaram um pequeno enigma,
Por causa dos amores impuros de deuses e deusas,
Que nas eras anteriores causaram um burburinho,